6.11.10

Quinta-feira

Eu virei a esquina e ele estava lá, parado. Os cabelos lisos escorridos caindo pelo rosto até o queixo, sujos como as ruas que eram sua casa. Os braços agarrados ao próprio corpo, a cabeça vacilante, tombando por causa do excesso de álcool. A garrafa de plástico ainda com o preço - em adesivo amarelo - rolou até o meio-fio e caiu na rua, o pouco barulho já o deixou desperto e ele me viu.
Com os olhos ainda fixos em mim, tirou do bolso um cigarro e o acendeu, soprou ao ar a fumaça cinza que tomou formatos fantasmagóricos, e deu aquele sorriso que se dá quando a pessoa sabe que encontrou o que procurava. Minha espinha dorsal contorceu-se em um arrepio de medo, acelerei o passo, e gritei internamente ao perceber que ele me seguia.
Meu joelho machucado começou a latejar de dor, e eu já não sabia por onde ir, tudo me parecia confuso. Eu tentava em vão descobrir o motivo daquilo. Sem pensar direito, parei bruscamente e me virei.
Encarava agora olhos cinzas muito vazios e sentia minha cintura sendo segurada firmemente por mãos que ferviam, e o estranho novamente sorriu. E disse, muito calmo e seguro, com seu bafo de bebida barata, qualquer coisa que eu não quis ouvir. E depois me entregou uma folha com anotações que me pareceram inúteis, esperou minha reação, atencioso, e logo percebi sua decepção em saber que eu não o desejava comigo. Estupidamente, tirou a folha de minhas mãos e correu, tonteando, para longe, até sumir.